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Bromélia descoberta nas montanhas mineiras impõe enigma botânico

Onde cientistas esperavam uma cor esbranquiçada, quase pálida, surgiu uma flor vibrante em tons de amarelo e vermelho. E assim, diante dos olhos da ciência, surgiu uma nova espécie e floriu um enigma. A descoberta da bromélia-enigmática (Stigmatodon enigmaticus) nas montanhas de Minas Gerais desafia o que a ciência sabe sobre este gênero botânico e tem instigado pesquisadores a juntar novas peças para tentar desvendar a história evolutiva desta planta singular que acabou de ser descoberta.

O achado foi feito durante expedições do projeto “Ecossistemas Rupícolas da Mata Atlântica”, realizadas pelo Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA). A planta foi encontrada a mais de 1.200 metros de altitude, numa porção da Serra do Padre Ângelo conhecida como Serra do Pinhão, no município de Conselheiro Pena, no leste de Minas Gerais. Seu habitat são os afloramentos rochosos em meio aos campos rupestres. Um ambiente propício a singularidades e espécies únicas.

No primeiro encontro com os pesquisadores, em maio de 2021, a bromélia-enigmática estava sem flores. Os botânicos observaram suas folhas arroxeadas cobertas por escamas esbranquiçadas, típicas do gênero Stigmatodon, que é composto por bromélias adaptadas à vida sobre as rochas na Mata Atlântica. Uma das características deste grupo é a floração noturna, com flores pouco coloridas, normalmente polinizadas por morcegos. 

Contrariando as expectativas dos botânicos, floresceu intensamente. “Aguardamos ansiosos a floração da planta, que imaginávamos ter flores esbranquiçadas ou esverdeadas, como todas as demais espécies de Stigmatodon. Qual foi a nossa surpresa, no entanto, quando a planta floresceu durante o dia e com cores vibrantes. Suas flores são amarelas com estruturas externas – chamadas de brácteas – vermelhas, características associadas à polinização por beija-flores e comuns no grupo irmão de Stigmatodon, o gênero Vriesea”, explica o pesquisador do INMA, Dayvid Couto, autor que liderou o estudo, publicado em fevereiro na revista científica Phytotaxa.

A bromélia-enigmática sem flores no seu habitat sobre rochas, as folhas são típicas do gênero Stigmatodon. Foto: Paulo Gonella

Apesar das suas flores contrariarem tudo que se sabe sobre o gênero Stigmatodon, todas as demais características morfológicas observadas pelos botânicos validaram a classificação da bromélia-enigmática dentro do gênero. “Mas estudos futuros usando dados do DNA e da anatomia dessas plantas nos ajudarão a testar hipóteses evolutivas dessa característica floral e do posicionamento dessa espécie no gênero”, ressalta Dayvid.

Ao mesmo tempo em que buscam respostas sobre o passado da bromélia-enigmática, os pesquisadores se preocupam com o seu futuro. Considerada “microendêmica” por ser conhecida em uma única localidade na Serra do Pinhão, com uma área de ocorrência estimada em apenas 4 km² e menos de 20 indivíduos maduros, a bromélia-enigmática não conta com nenhuma unidade de conservação para resguardar seu pequeno habitat. Por isso, os pesquisadores sugerem que a planta já seja classificada como Criticamente Em Perigo de extinção, o grau mais alto de ameaça.

O principal perigo que ronda a bromélia é o fogo, muito usado pelos proprietários rurais do entorno para abertura e renovação pastagem, e a invasão de espécies exóticas como o capim-gordura e samambaias do gênero Pteridium, que avançam sob o espaço das nativas.

Para tentar assegurar a proteção ao habitat da bromélia enigmática e de diversas outras espécies que vivem na Serra do Padre Ângelo – apenas na última década mais de 30 espécies foram descritas na região, sendo 26 endêmicas – os pesquisadores têm se mobilizado para propor a criação de um Monumento Natural, em âmbito estadual, que proteja os dois maciços da serra e o Pico da Aliança, no município de Alvarenga. 

Paisagem da Serra do Pinhão, na região da Serra do Padre Ângelo, única localidade em que vive a bromélia-enigmática. Foto: Paulo Gonella

“A ideia do Monumento é porque essa área é toda fragmentada, tem várias propriedades privadas, pequenas fazendas que não fariam sentido de serem incluídas, então o desenho de um Monumento Natural seria o mais adequado”, conta a ((o))eco outro autor do estudo, o botânico Paulo Gonella, da Universidade Federal de São João Del-Rei (UFSJ). Paulo acrescenta ainda que a elaboração de uma proposta para criação da unidade de conservação é uma das ações previstas no Plano de Ação Territorial (PAT) Capixaba-Gerais.

Além disso, a própria prefeitura de Conselheiro Pena, município onde foi descoberta a bromélia enigmática, discute a criação de um parque municipal que proteja a porção da serra que se encontra no seu território.

Um dos objetivos do projeto do INMA é justamente inventariar a biodiversidade dos ambientes rochosos e levantar dados que possam servir de subsídio para a criação de políticas públicas para a conservação desses ambientes. 

“Queremos chamar atenção para área, que ela está desprotegida, que essa grande diversidade de plantas e animais está desprotegida. E para as pessoas também, a importância dessa área de conservação para transformação da economia local e para ter um turismo mais sustentável”, completa o pesquisador. 

Por O Eco

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