Projeto recupera mais de 2.500 corais em Pernambuco
Os recifes de corais brasileiros vêm enfrentando diversas ameaças, principalmente, relacionadas ao aquecimento global e ao branqueamento, que podem levá-los à morte. Por isso, fomentar ações de recuperação e conservação desses animais é fundamental. Uma dessas iniciativas é o Projeto Coralizar, que já ajudou a salvar mais de 2.500 corais das espécies Mussismilia harttii e Millepora alcicornis em Porto de Galinhas e Tamandaré, no litoral Sul de Pernambuco, na Área de Proteção Ambiental (APA) Costa dos Corais, a maior área protegida marinha do país.
Recifes de corais são indispensáveis para a manutenção de toda a vida marinha. Estima-se que 25% das espécies dos oceanos sejam dependentes de recifes de corais em alguma fase de seu ciclo de vida. Pesquisadores destacam que, assim como as florestas tropicais, que abrigam imensa biodiversidade, os recifes de corais auxiliam no equilíbrio do clima em todo o mundo e funcionam como barreiras naturais na proteção de regiões costeiras, onde vivem mais de 60% da população brasileira. Além disso, podem gerar emprego e renda em ações de turismo sustentável.
Segundo Ana Lídia Gaspar, diretora executiva do Instituto Recifes Costeiros, o fato de o laboratório ser próximo da área de estudo e recuperação dos animais é uma das grandes vantagens da ação em Tamandaré. Ela acredita que os resultados que virão têm potencial para alavancar os trabalhos na região. “Estamos ansiosos… poder ter essas medidas de taxas de recuperação, de sobrevivência, desses fragmentos que estavam ali, condenados, e que a gente pôde recuperar e restaurar nossos recifes. Nosso objetivo é crescer. Quem sabe multiplicar o projeto para os outros municípios da Costa dos Corais?”, diz.
O envolvimento das comunidades locais é fundamental. Por isso, em Tamandaré, a transmissão de conhecimento para o manejo de corais tem sido direcionada aos moradores, em especial pelos agentes do Instituto Recifes Costeiros, que também são pescadores e ex-pescadores. “As atividades de capacitação são teóricas e práticas e já resultaram nos primeiros berçários de corais implementados”, explica Rudã Fernandes, coordenador técnico da Biofábrica de Corais.
Tamandaré é um dos municípios mais afetados pelo branqueamento de corais nos últimos tempos. Apesar de não haver dados precisos sobre a quantidade perdida, moradores relatam que a redução é perceptível. Com o trabalho de restauração, a expectativa é de ampliação da cobertura de corais na região, beneficiando diretamente a biodiversidade local e aumentando as possibilidades de turismo sustentável com a prática de mergulhos.
O pescador João Virgínio, agente de campo do Instituto Recifes Costeiros, salienta que o projeto vai ajudar a recuperar a paisagem e que se sente feliz por fazer parte disso. “Veio o aquecimento global, a água esquentou e eles morreram. Isso é muito importante para mim: ao invés de ver o coral ali, caído e morto, e não poder fazer nada… Hoje eu sei como é que se faz. Então, é importante para mim e para minha família poder participar”, frisa.
A recuperação de corais começa com a coleta dos animais que se desprenderam das colônias e que seriam soterrados e mortos. “O desprendimento pode ocorrer por diversos fatores: enfraquecimento do próprio animal; ações mecânicas, como movimentos das marés; ou ações humanas, como pisoteamento e choque com embarcações ou remos”, explica Fernandes. Depois, já em laboratório, os animais são fragmentados em partes menores, medidos, pesados e instalados em mesas de cultivo antes de serem colados nos berçários e devolvidos ao mar.
Os berçários, como chamam os pesquisadores, são estruturas especialmente desenvolvidas para acomodar os corais recolhidos do fundo do mar, permitindo que eles possam se recuperar e cresce novamente. “São fundamentais para o planejamento e desenvolvimento de técnicas de restauração de corais em larga escala e de forma sustentável”, afirma Vinícius Nora, analista de conservação do WWF-Brasil.
O manejo dos animais, apesar do uso de ferramentas como furadeiras e alicates, precisa ser delicado, preciso e rápido. É uma luta contra o tempo para deixá-los fora da água o mínimo possível. “É um trabalho que dá uma satisfação, uma coisa boa dentro da gente. Porque a gente sabe que está fazendo o bem para a natureza. E agora a gente está devolvendo para o mar o que foi destruído. Estamos na reconstrução para aumentar a população de corais”, diz o pescador Paulo Fernando, agente de campo do Instituto Recifes Costeiros.
Criado em 2019, em Porto de Galinhas, o Coralizar foi idealizado pelo WWF-Brasil, com o apoio do Instituto Neoenergia e da AIEP, e é executado pelo Instituto Nautilus, Biofábrica de Corais, com a participação da Universidade Federal de Pernambuco e da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Em Tamandaré, também fazem parte do projeto o centro de pesquisa do ICMBio, o Cepene (Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Marinha do Nordeste) e o Instituto Recifes Costeiros.
A parceria com o Cepene é fundamental para a expansão dos trabalhos na região. “Temos a possibilidade de uma escala muito maior”, salienta Nora. “Mas essa não pode ser a única frente de combate às mudanças climáticas. Precisamos agir em duas frentes: mitigar impactos de emissões de carbono e desenvolver outras tecnologias inovadoras que aumentem a resiliência dos recifes de corais, como estamos fazendo no Coralizar”.
O desenvolvimento de metodologias apoiadas pelo Projeto Coralizar para a restauração de corais é conduzido pela Biofábrica de Corais. Na primeira etapa, foram realizadas pesquisas em laboratório para a criação de protocolos de viabilidade para que o modelo pudesse ser replicado em outros lugares da costa brasileira. Para isso, foram criados métodos para a coleta, armazenamento, manejo e acompanhamento do crescimento dos animais.
Mesmo com as dificuldades impostas pela pandemia de Covid-19, os pesquisadores conseguiram avançar e desenvolver esses métodos. “As ações têm se mostrado eficientes. Hoje, há mais de 2.500 corais em processo de recuperação que demonstram que a tecnologia adotada é viável e replicável”, reforça Nora.
No Coralizar são priorizadas duas espécies. Escolhida por ser endêmica do Brasil e ameaçada de extinção, a Mussismilia harttii é fundamental para ações de restauração, pois contribui para a conservação dos recifes como um todo. Já a Millepora alcicornis, apesar de não constar como ameaçada na lista vermelha, possui maior complexidade em sua estrutura tridimensional e cresce mais rápido, facilitando os resultados no cultivo. Nas ondas de calor de 2019 e 2020, ambas as espécies sofreram sérios danos, com altos índices de branqueamento.
O que é branqueamento de corais?
O branqueamento de corais é um fenômeno que provoca a perda de cor desses animais que vivem presos no fundo do mar. Eles ficam com o esqueleto exposto sem uma alga que os envolve. Por diversos motivos, que vão desde o aquecimento da água até a falta de disponibilidade de alimentos, essa alga se desprende, desfazendo a relação de simbiose com os corais.
Esse problema é diretamente acentuado pela crise climática, resultante do aquecimento global, acidificação dos oceanos e impactos humanos. Pode ser revertido, mas, em casos graves, leva à morte de colônias de corais. Para saber um pouco mais sobre o branqueamento e os corais, ouça este podcast.
Por Ciclovivo
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